sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Mas como ia dizendo...

Eu e El Brujo abrimos uma cerveja. Já passava da meia-noite, o ar estava abafado e Noel Coward despejava uma canção tesuda em meio a livros, discos, contas atrasadas, recortes de jornais e objetos insólitos. A vida certamente tinha seus momentos de revolta, mas isso não a impedia de ter seus minutos de esplendor.
“Isso é único...”, suspirou El Brujo após um gole.
“Com certeza. Eu baixei algumas coisas dele...”
“Eu quase não acho discos desse sujeito em Hardcore Brasília.”
“Ou do Bobby Short...”
“É, mas acho que tenho uma fita com uma gravações do Short no Carlyle...”
“Sei, já ouvi. Eu até procurei um DVD na Barnes&Noble mas não tinha no estoque.”
O silêncio se fez novamente, em respeito a Coward. Mas aquela era Hardcore Brasília, e até pessoas geniais tais como Noel Coward e Bobby Short precisavam arregaçar as manguinhas para serem respeitadas pelos temíveis hombres candangos.
“Que calor filho-da-puta, hein?!”, vociferou El Brujo.
“Ainda bem que existe cerveja gelada.”

Aqueles momentos em que o cérebro pára...

Tive sorte em fazer a bateria do demônio Azulado funcionar. A manhã estava quente, o Demônio Azulado estava um forno e minha paciência estava esgotada. Ainda tinha de levar a ex para o trabalho, já que seu carro sofrera uma tentativa de arrombamento e a porta do motorista exibia um rombo de chave de parafuso. Até pensei que 2009 seria apenas uma repetição de 2008, mas isso era exagero. O Destino não seria tão pouco original comigo. De qualquer maneira, peguei a Esplanada dos Ministérios, deixei a ex no prédio de traços monótonos e voltei para a via que me levaria de volta pra casa. O vento e a música ajudavam bastante, mas eu pensava em absolutamente nada. Nenhum projeto, nenhum desejo, nenhuma forma de alegria com relação à nova fase. Imobilidade cerebral. Neurônios tomando água mineral com gás em um copo com bastante gelo.
Tudo estava calmo em casa.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Hardcore Brasília nas Garras de El Brujo

Após duas semanas em Pitboyland, estava de volta à capital. Pronto para um recomeço daqueles, cheio de coisa pra resolver, mas sempre contando com o apoio do principal embaixador de Hardcore Brasília, El Brujo. Mal havia chegado em casa, coloquei as malas num canto, desci até a garagem e entrei no Demônio Azulado. Quando cheguei ao folclórico prédio de El Brujo, o Mendigo Iluminado estava lá, falando sozinho e fumando um cigarrinho qualquer. “Pois é, essa crise vai levar o mundo pro buraco. Mas não sou eu quem vai cavar...”.
Subi os lances de escada e toquei a campainha. Acho que estava tocando Dean Martin. El Brujo abriu a porta ao mesmo tempo em que segurava uma coxinha de padaria em uma das mãos.
“Voltou, foi?”
“Pois é. Tem cerveja gelada?”
“Porra, abri a última pra acompanhar esta coxinha. Vai lá na cozinha...”
“Valeu.”
A cerveja estava especial. Nada como cerveja em Hardcore Brasília. O papo começou de maneira calma, sem ir com muita sede ao pote. Mulheres, projetos, nacos de desespero e demais medos semanas antes da mudança para outro apartamento. Agora que a ex já arranjou uma kitchnet pra ela, começo a procurar apartamento para mim. Ainda não sei se vai ser um esquema quarto-e-sala ou algo menor. Tenho muitos livros, muitos discos, muito papel, oito estantes ao todo; além dos móveis do escritório, o rack pra televisão, a própria televisão, e um sofá-cama. Até dormiria em um simples colchão no chão, mas até isso está indefinido.
“Já achou algum?”
“Tem um na 314 Norte. Ótimo, pequeno, todas as minhas coisas cabem lá dentro, e ainda é calmo. Só não tem garagem, mas o porteiro segura as pontas e passa confiança.”
“Quanto?”
“Quase 200 paus. Mas acho que o cara faz por menos se pagarmos à vista.”
“Meio caro, mas é um investimento.”
“Com certeza.”
Quando a cerveja e as coxinhas de padaria acabaram, decidimos passar pelo Beirute da Norte. Entramos no Demônio Azulado – que, aliás, após duas semanas parado, começara a dar sinais de cansaço – e pegamos o Eixinho. Não tivemos dificuldade para estacionar. Começamos com uma Original, quatro quibes fritos e uma discussão sobre a polêmica frase da mais recente protegée de Sílvio Santos, Maisa: “...eu gosto de um pobrinho...”.
Afinal, a noite era uma criança.